Nós, brasileiros, somos capazes de sonegar meio
trilhão de reais de Imposto de Renda só no ano passado. Como somos capazes de
vender e comprar DVDs piratas, cuspir no chão, desrespeitar o sinal vermelho,
andar pelo acostamento e, ainda por cima, votar no Collor, no Maluf, no Newtão
Cardoso, na Roseana, no Marconi Perillo ou no Palocci.
O panelaço nas varandas gourmet de domingo (08) não
foi contra a corrupção. Foi contra o incômodo que a elite branca sente ao
disputar espaço com esta gente diferenciada que anda frequentando aeroportos,
congestionando o trânsito e disputando vaga na universidade.
Elite branca que não se assume como tal, embora
seja elite e branca. Como eu sou. Elite branca, termo criado pelo conservador
Cláudio Lembo, que dela faz parte, não nega, mas enxerga.
Como Luís Carlos Bresser Pereira, fundador do PSDB
e ex-ministro de FHC, que disse:
“Um fenômeno novo na realidade brasileira é o ódio
político, o espírito golpista dos ricos contra os pobres. O pacto nacional popular
articulado pelo PT desmoronou no governo Dilma e a burguesia voltou a se
unificar. Surgiu um fenômeno nunca visto antes no Brasil, um ódio coletivo da
classe alta, dos ricos, a um partido e a um presidente. Não é preocupação ou
medo. É ódio. Decorre do fato de se ter, pela primeira vez, um governo de
centro-esquerda que se conservou de esquerda, que fez compromissos, mas não se
entregou. Continuou defendendo os pobres contra os ricos. O governo revelou uma
preferência forte e clara pelos trabalhadores e pelos pobres. Nos dois últimos
anos da Dilma, a luta de classes voltou com força. Não por parte dos
trabalhadores, mas por parte da burguesia insatisfeita. Quando os liberais e os
ricos perderam a eleição não aceitaram isso e, antidemocraticamente, continuaram
de armas em punho. E de repente, voltávamos ao udenismo e ao golpismo.”
Nada diferente do que pensa o empresário também
tucano Ricardo Semler, que ri quando lhe dizem que os escândalos do mensalão e
da Petrobras demonstram que jamais se roubou tanto no país.
“Santa hipocrisia”, disse ele. “Já se roubou muito
mais, apenas não era publicado, não ia parar nas redes sociais”.
Sejamos francos: tão legítimo como protestar contra
o governo é a falta de senso do ridículo de quem bate panelas de barriga cheia,
mesmo sob o risco de riscar as de teflon, como bem observou o jornalista
Leonardo Sakamoto.
Ou a falta de educação, ao chamar uma mulher de
“vaca” em quaisquer dias do ano ou no Dia Internacional da Mulher, repetindo a
cafajestagem do jogo de abertura da Copa do Mundo.
Aliás, como bem lembrou o artista plástico Fábio
Tremonte: “Nem todo mundo que mora em bairro rico participou do panelaço.
Muitos não sabiam onde ficava a cozinha”.
Já na zona leste, em São Paulo, não houve panelaço,
nem se ouviu o pronunciamento da presidenta, porque faltava luz na região, como
tem faltado água, graças aos bons serviços da Eletropaulo e da Sabesp.
Dilma Rousseff, gostemos ou não, foi
democraticamente eleita em outubro passado.
Que as vozes de Bresser Pereira e Semler prevaleçam
sobre as dos Bolsonaros é o mínimo que se pode esperar de quem queira,
verdadeiramente, um país mais justo e fraterno.
E sem corrupção, é claro!
(Artigo inicialmente publicado no Blog do Juca)
Texto: Juca Kfouri
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