Sob risco de ‘desapropriação zero’, Dilma quer acelerar reforma agrária
Ameaçada de encerrar o ano com o pior desempenho na área desde a redemocratização, presidente cobra 100 novos decretos
20 de outubro de 2013 | 22h 10
Roldão Arruda - O Estado de S.Paulo
Após atravessar mais de dez meses sem desapropriar um único imóvel rural para
a reforma agrária, a presidente Dilma Rousseff resolveu mudar. Na semana
passada, disse a um grupo de representantes de movimentos sociais que estava
cobrando providências do ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas. E que
o ministro, sentado ao seu lado, havia prometido encaminhar a ela um conjunto de
100 novos decretos de desapropriação de terras até o final de dezembro.
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2013
tem ‘desapropriação zero’ no campo até agora
Andre Dusek/Estadão
O ministro Pepe Vargas e Dilma durante
lançamento de programa
Ainda não se sabe como o ministro vai obter resultados tão rapidamente, após
tantos meses de inércia. Mas, se forem mesmo assinados pela presidente, os
decretos prometidos acrescentarão cerca de 200 mil hectares às áreas de
assentamentos rurais no País, segundo estimativas do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (Incra).
A iniciativa pode ajudar a conter as críticas que a presidente vem recebendo
de movimentos de sem-terra, indígenas, quilombolas e ambientalistas. Seus
representantes afirmam que Dilma ignora os movimentos sociais, ao mesmo tempo
que se aproxima cada vez mais da bancada dos ruralistas no Congresso. O coro foi
engrossado dias atrás com a oficialização da entrada de Marina Silva no jogo
eleitoral de 2014, ao lado do governador Eduardo Campos, do PSB. A ex-senadora
entrou em cena afirmando que o atual governo retrocedeu em questões ambientais.
No Incra, funcionários descontentes com o rumo da reforma agrária de Dilma
afirmam que os novos decretos só serão assinados com o abandono do discurso
sobre a qualidade dos assentamentos. Desde o início do ano, ao justificar a
demora na criação de assentamentos, representantes do governo diziam que a
presidente estava exigindo boas condições para o seu desenvolvimento. Em
fevereiro, o ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência,
disse até que Dilma não criaria novas favelas rurais.
Marco.
Dez dias
antes da cobrança de Dilma ao ministro, o Estado havia divulgado que, com os
resultados obtidos até aqui, ela deve entrar para a história com um registro
pouco agradável para um político petista: a de presidente
que menos desapropriou terras para a reforma desde o início da redemocratização,
em 1985. Pode perder até para Fernando Collor de Mello.
A reportagem saiu no dia 7. Uma semana depois, no dia 14, o ministério do
Desenvolvimento Agrário baixou uma portaria destinada a facilitar os processos
de desapropriação. Passados mais três dias, a presidente e o ministro anunciaram
os decretos que vão sair do forno em menos de dois meses.
"Eu quero informar a vocês que o ministro Pepe Vargas e seu ministério
assumiram comigo o compromisso de ter 100 decretos de desapropriação até
dezembro", disse Dilma. No embalo, ela retomou a questão da qualidade dos
assentamentos criados em seu governo, diferenciando-os dos que foram realizados
pelos seus antecessores: "No nosso País já se assentou famílias em lugares onde
elas não tinham como se sustentar. Nós sabemos disso. O ministro (Vargas) está
fazendo um grande esforço para melhorar a qualidade do decreto. Essa é uma
questão que não só eu apoio, mas é uma questão que eu exijo, porque nós não
temos o direito de colocar pessoas famílias em um lugar onde não têm de onde
tirar renda."
Na avaliação de agrônomos do Incra envolvidos com os processos de
desapropriação de terras, porém, o decreto assinado pelo ministro no dia 14
reduz drasticamente as exigências dos processos para a criação de assentamentos.
"Ele flexibiliza outro decreto assinado em fevereiro, que exigia estudos mais
rigorosos e normas internas para a criação de novos assentamentos", diz Ricardo
Pereira, presidente do Sindicato Nacional dos Peritos Federais Agrários. "O
problema é que não foram editadas normas para levar adiante os processos, o que
acabou emperrando a obtenção de terras e a reforma." Guerra está convencido de
que o governo deixou de lado a qualificação: "Fez isso para se livrar de imagem
de decreto zero". O presidente do Incra, Carlos Guedes, nega qualquer
retrocesso. "A portaria assinada não mudou nada nas exigências. Apenas tratou de
ritos", afirma.
Sobre o cumprimento da meta prometida a Dilma, diz que não haverá problemas
para alcançá-la. "Na verdade temos quase 130 áreas em condições de serem
desapropriadas. Falamos em 100 porque isso permite uma margem interessante para
se chegar à meta. Em todas elas já temos informações sobre o cumprimento social
da área, o custo do assentamento das famílias e a viabilização econômica do
projeto, com a geração de rendas famílias." A expectativa agora é de que as
primeiras desapropriações aconteçam daqui a quinze dias.
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