Empresários vencem e Câmara aprova texto-base
do PL da Terceirização
Matéria contraria
trabalhadores, por criar condições de aprofundar precarização de direitos e
salários.
O primeiro embate real desta legislatura que pôs em xeque
as divergências observadas entre a bancada empresarial e os
parlamentares representantes dos direitos dos trabalhadores no Congresso foi
consolidado na noite do último dia 08 de abril, com a aprovação, pela Câmara
dos Deputados, do Projeto de Lei (PL) 4.330, que regulamenta a atividade de
terceirização no país. O resultado foi sintomático do tamanho da representação
de cada bancada e do poder do lobby feito pelas empresas privadas junto ao
Legislativo: dos 463 deputados presentes na sessão, 324 votaram sim ao PL,
contra 137 votos pelo não e duas abstenções.
Apenas
PT, PCdoB e Psol votaram CONTRA a proposta, que tramita há 11
anos no Congresso, mas que foi apontada pelos parlamentares que a aprovaram
como necessária para reduzir os impactos da atual redução da atividade
econômica. A aprovação do texto base do PL é considerada pelas representações
de trabalhadores e por outros movimentos sociais um retrocesso e um ataque a
direitos trabalhistas conquistados em diversas lutas do movimento sindical.
A principal polêmica entre as que o PL provoca é a
terceirização em todas as atividades das empresas. Na avaliação de centrais
sindicais, representantes do Judiciário e entidades diversas da sociedade
civil, a autorização resultará em perdas salariais e sociais dos trabalhadores.
No plenário da Câmara prevaleceu a estratégia dos
defensores do PL de seguir o rito traçado pelo presidente da Casa, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ). Ele conseguiu manter a votação na sessão plenária, apesar
de discussões de ordem regimental, apresentação de requerimentos para adiar e
cancelar a votação, pedidos para retirada da matéria de pauta e tentativas de
negociação de novos acordos.
Poucas horas antes da aprovação do PL – concluída por
volta das 21h30 –, Cunha fez um acordo para que apenas o texto base fosse
apreciado. Sendo assim, os destaques apresentados por deputados que se
posicionaram contrários ao teor do projeto (e que pedem a supressão, no texto,
de itens considerados prejudiciais para os trabalhadores), ficaram para ser
discutidos e apreciados dia 14/04.
O fatiamento, apresentado e proposto como forma de
aprofundar a discussão dos destaques, ajudou a acelerar a votação da matéria –
tudo o que os defensores do PL desejavam e que os opositores não queriam.
Antes disso, um longo debate ocupou o plenário: Cunha não
aceitou recurso a uma emenda rejeitada pelo relator, deputado Artur Maia
(SD-BA), durante a leitura do seu relatório, sob argumento de que a aceitação
desobedeceria o regimento interno da Casa.
Maia explicou que não aceitaria a emenda por considerá-la
inconstitucional, mas fez uma leitura rápida do documento. Após a leitura,
passou a ler uma errata ao relatório antigo que tinha acabado de ler – a errata
teria sido entregue às pressas por assessores do seu gabinete.
‘Antidemocrático’
Diante do atrapalho do relator, o deputado Alessandro
Molon (PT-RJ), autor da emenda, pediu um recurso contestando a decisão de
Arthur Maia. O presidente da Câmara, porém, entendeu que não seria possível
receber esse recurso sem um número limite de assinaturas e não deu prazo
suficiente para que os deputados providenciassem tais assinaturas. “Isso é
antidemocrático”, reclamou a deputada Moema Gramacho (PT-BA).
Na prática, o gesto que terminou sendo apontado como “má
vontade” de Eduardo Cunha foi considerado uma reação ao fato de, no início da
tarde, Alessandro Molon ter interposto um mandado de segurança junto ao Supremo
Tribunal Federal (STF) pedindo o cancelamento da sessão por não ter respeitado
a regra de trancamento da pauta até a votação de uma medida provisória, a MP
661. A mesa diretora da Câmara contesta essa regra e, dependendo da decisão do
tribunal, a votação poderá vir a ser anulada.
Quatro emendas
No seu relatório, Arthur Maia cumpriu o prometido e
incorporou quatro emendas negociadas que alteram o texto. Mas o principal ponto
criticado pelos que se opõem ao projeto, que é a terceirização na
atividade-fim, continuou da forma como estava, sem negociações. A princípio, as
emendas seriam todas apresentadas pelo deputado Paulo Pereira da Silva
(SD-SP), o Paulinho da Força, mas uma última terminou sendo incluída ao
relatório como emenda de bancada.
Três das emendas referem-se a temas como a
responsabilidade subsidiária das empresas, a representação sindical nas
categorias terceirizadas e a chamada “quarteirização” – possibilidade de o país
passar a ter, por exemplo, empresas sem empregados, utilizando serviços
contratados de fornecedoras de mão de obra terceirizada e até que estas
próprias empresas também terceirizem serviços oferecidos.
Já a quarta emenda aprovada faz parte do compromisso
assumido entre Maia e Eduardo Cunha com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e
diz respeito ao recolhimento de contribuições e imposto de renda.
A pedido do ministro da Fazenda, o relator incluiu a
obrigação de a empresa contratante fazer o recolhimento antecipado de parte dos
tributos devidos pela contratada. Dessa forma, deverão ser recolhidos 1,5% de
Imposto de Renda na fonte ou alíquota menor prevista na legislação tributária;
1% da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); 0,65% do PIS/Pasep; e
3% da Cofins. O deputado afirmou, ao ler seu relatório, que o PL “segue uma
linha média, capaz de atender os trabalhadores, os empresários e a economia
brasileira”. Destacou, ainda, que muito da precarização do trabalho
terceirizado decorre da falta de uma regulamentação. Não convenceu os
opositores à matéria.
‘Dia triste’
“Hoje é um triste dia. Os direitos trabalhistas serão
derrubados com esse projeto”, criticou num discurso a deputada Luciana
Santos (PCdoB-PE). “É estranho que falam em 11 anos de tramitação do
projeto e ao mesmo tempo tanta gente novata entrou nesta Casa em fevereiro
passado. Como se pode dizer que a matéria foi bem discutida se durante 11 anos
o assunto foi objeto de divergências e agora vai ser votada de forma tão
atabalhoada?”, questionou o líder de governo na Câmara, José Guimarães
(PT-CE), antes da votação final.
Além de barrar todas as tentativas de adiar a votação, o
presidente ainda fez uma importante sessão plenária ter suas galerias vedadas
ao público – e os deputados viram câmeras fotográficas e de televisão
registrarem uma sessão que não contou com a presença de cidadãos.
Embora no início da tarde tenha sido ensaiada uma
abertura das galerias, Cunha manteve a proibição do acesso de manifestantes com
a explicação de que estava cuidando da “integridade” dos parlamentares.
Vazias
No meio da tarde, o ministro Marco Aurélio de Mello, do
STF, concedeu liminar em habeas corpus
impetrado por representantes da CUT, na qual autorizava o acesso dos
sindicalistas às galerias. A notícia até estimulou a ida de várias pessoas que
estavam dentro do Congresso até o local, mas elas não conseguiram ficar. Na sua
decisão, o magistrado enfatizou que entende como “inimaginável que se criem
obstáculos ao ingresso do cidadão em qualquer das Casas que integram o
Congresso Nacional”.
Como já estava na mesa comandando os trabalhos, o
presidente da Câmara disse que não tinha recebido formalmente a decisão e só
iria se manifestar após tal recebimento. Ele reiterou sua posição de não abrir
a sessão ao público. Afirmou que vai avaliar o habeas corpus e pode vir a
recorrer da decisão, o que levou à expectativa de uma nova disputa entre o
Legislativo e o Judiciário.
Por parte dos deputados, só restou a iniciativa de, como
forma de substituir as pessoas que costumam acompanhar votações polêmicas do
tipo, levantarem, eles mesmos, uma grande faixa do plenário com os dizeres:
“Fim da CLT. Ataque aos trabalhadores. Vote não”. Tratou-se de uma última forma
encontrada para estimular os colegas que estavam em dúvida, durante a votação.
Mas o levantamento da faixa gerou protestos e certo tumulto.
Além de marcar um momento insólito nas votações da Câmara e marcar o dia como
aquele em que os próprios deputados tiveram que fazer ao mesmo tempo dois papéis:
o de parlamentares e, também, de manifestantes – para pedir pelos direitos dos
cidadãos do lado de lá do plenário.
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