Política
Mino Carta
Editorial
26.04.2013
O gigante Napolitano
Giorgio Napolitano, primeiro presidente comunista na história da República italiana Foto: Luca Bruno/AP
A reeleição do presidente, a representar a própria encarnação do Estado, é fato inédito na história da República italiana, mas não contradiz uma das Constituiçõesmais democráticas e avançadas do planeta, elaborada por uma Assem bleia Constituinte exclusiva (como não se deu no Brasil pós-ditadura) e capaz de afirmar no seu primeiro artigo ser baseado “no trabalho” aquele regime de governo. Haja coragem e clareza. Não sei de outra que chegue a tanto.
Como presidente, Napolitano cogitava de uma nova visita ao Brasil. Desistiu por causa do chamado Caso Battisti, quando o País deu asilo ao terrorista assassino em nome de razões tão inviáveis quanto patéticas. O episódio, nascido de uma rata monumental do ex-ministro da Justiça Tarso Genro, só serviu para exibir, além da arrogante leviandade da polícia francesa, a ignorância abissal de políticos, magistrados, professores universitários e intelectuais brasileiros. Os nossos liliputianos.
Serei claro, espero pela última vez, com a premissa de que é impossível hierarquizar as provas da ignorância. Começo ao acaso pela seguinte: acreditar que um ladrãozinho do arrabalde romano disposto a inventar um engajamento pretensamente político, a matar dois inocentes e aleijar outro, a participar de mais dois assassínios, a tentar outro sem sucesso, a atirar nas pernas de alguns (gambizzare, dizia-se), equipara-se a quem, no Brasil, pegou em armas contra a ditadura. Não sabem os ignorantes de plantão, e direi abundantes a favor da rima, que o terrorismo à italiana foi largamente infiltrado pela CIA com o objetivo de evitar o esboçado entendimento entre comunistas e democrata-cristãos, a dividirem o eleitorado italiano no fim da década de 70. Aludo ao chamado compromesso storico. Aldo Moro, que negociava com Enrico Berlinguer, pagou por isso com a morte, para alegria do império do Ocidente.
A tigrada pretendia acabar com o mesmo Estado de Direito que, na presidência de Giorgio Napolitano, foi tido pelos cérebros nativos como incapaz de garantir a segurança dos seus presos. O Ministério da Justiça do Brasil sustentava que, devolvido à Itália, conforme um tratado de extradição assinado havia tempo, Battisti correria risco de vida. Foi afronta grave, que Napolitano à época não perdoou. A voz do Estado italiano fez-se ouvir pela indignação do presidente. E não faltava quem, impavidamente, sustentasse, por escrito e de viva voz, que a pátria de Dante nos anos 70 estivera entregue a um regime de extrema-direita, exatamente naquele período em que brasileiros perseguidos pela ditadura procuravam refúgio por lá. E não faltou quem confundisse Estado com governo, Napolitano com Berlusconi, mesmo entre quem se apresenta como jurista, mas não percebe a diferença entre presidencialismo e parlamentarismo. Napolitano é o presidente de uma República parlamentar, embora, neste preciso instante, funcione como o avô empenhado
na tarefa generosa de devolver o juízo aos netos que traíram seus pais.
OBS: TRANSCRITO DA REVISTA "CARTA CAPITAL"
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